Dois exercícios poderosos de autocompaixão para transformar a autocrítica

Dois exercícios poderosos de autocompaixão para transformar a autocrítica

Ano passado publicamos uma newsletter falando sobre as vantagens de se desenvolver a autocompaixão, uma habilidade que nos permite ter maior autoestima do que autocrítica, bem como maior aceitação de nós mesmos, maior senso de interconectividade com as pessoas e maior estabilidade emocional, entre outros benefícios.

Mas para se aproveitar os frutos dessa prática é preciso… Praticar. Por isso trago dois exercícios importantes do livro “Autocompaixão – Pare de se torturar e deixe a insegurança para trás”, da pesquisadora americana especialista em autocompaixão Kristin Neff. Eles nos ajudam a recuperar e voltar para nós mesmos a habilidade humana inata de sentirmos compaixão. E, portanto, autocompaixão.


A carta

A primeira parte deste exercício consiste em identificar algo ou uma situação que te cause um sentimento de inadequação, ou insatisfação consigo. Pode ser algo da sua aparência física, um problema no trabalho, ou em algum relacionamento. Pensando nesse exemplo, como você se sente? Identifique quais emoções surgem quando pensa a respeito desse aspecto de si mesmo.

Pronto. Agora pense num amigo imaginário, incondicionalmente amável, aberto, bondoso e compassivo. Imagina que ele possa ver todos os seus pontos fracos e suas fortalezas, incluindo isso que você acabou de pensar. Agora escreva uma carta para si mesmo, a partir da perspectiva desse amigo bondoso. O que ele diria sobre essa sua “falha”, sob a ótica da compaixão ilimitada? O que esse amigo escreveria para te lembrar de que você é apenas humano, assim como todos os outros, que têm pontos fortes e fracos?

Tente trazer na carta um forte senso de aceitação pessoal, bondade e carinho, além de desejos de saúde e felicidade. Guarde-a e a leia após um tempo, deixando que as palavras generosas te toquem de verdade. Isso nos mostra, de maneira prática, como o amor, a conexão e a aceitação estão sempre conosco, dentro de nós. Assim, podemos acessá-los sempre que precisarmos.


As duas cadeiras

Este exercício tem como modelo o diálogo de duas cadeiras estudado pela terapeuta Leslie Greenberg, da abordagem Gestalt. A ideia é sentar-se em cadeiras diferentes para nos ajudar a entrar em contato com diferentes partes de nós, muitas vezes conflitantes.

Primeiro organize três cadeiras vazias, em um arranjo triangular. Depois, pense em uma situação que te provoca uma autocrítica severa. Eleja uma cadeira para representar a voz da sua autocrítica, outra para simbolizar a parte de você que se sente julgada e uma terceira para retratar um observador sábio e compassivo.

Pode parecer um pouco bobo fazer esse exercício, mas funciona. Sentar em cadeiras diferentes e emular um papel específico tem um efeito surpreendente.

Sente-se primeiro na cadeira do autocrítico. Nela, fale sobre o que sua autocrítica está pensando e sentindo em relação à situação escolhida. Um exemplo: “acho ridículo você ficar ansiosa com isso. É só sentar e fazer seu trabalho”. Note as palavras, o tom de voz, a postura e como essa parte de você se sente.

Em seguida, se sente na cadeira do criticado. Entre em contato com quais sentimentos e emoções emergem ao ouvir isso e fale sobre como você se sente, respondendo para o crítico. Algo como: “eu me sinto muito triste e fico com raiva quando você fala assim comigo. É como se nada do que eu fizesse fosse bom o suficiente. E isso me deixa mais ansiosa ainda”. Mais uma vez, observe o tom de voz e a postura corporal desse aspecto seu.

Vá permitindo um diálogo entre essas duas partes, até que cada uma expresse totalmente seu ponto de vista e seja ouvida. Agora ocupe a cadeira do observador compassivo e invoque sua mais profunda sabedoria, preocupação afetiva e compaixão para se dirigir a ambas as partes. O que diz seu eu compassivo para o crítico? Um exemplo, pensando na linha de raciocínio acima, pode ser: “isso parece com como sua mãe falava com você, né? Vejo um grande medo seu de que o trabalho não seja feito e que isso te prejudique”.

E para o criticado? “Deve ser muito difícil ouvir esse tipo de crítica e julgamento todos os dias. É uma voz que te oferece mais um peso do que ajuda. E tudo o que você queria era ser aceita como é e se sentir livre para errar, como todo mundo, e fazer suas atividades da maneira que achar melhor.”

Ouvindo a fala do observador, tente relaxar e se abrir para essas mensagens. Quais palavras compassivas surgem naturalmente? Qual é seu tom de voz e sua postura corporal?

Quando o diálogo terminar, reflita sobre o que aconteceu, quais são seus padrões de funcionamento e quais as novas maneiras de ver a situação podem ser mais produtivas. Estabeleça a intenção de se relacionar consigo de forma mais gentil e saudável. Por debaixo dos velhos hábitos de autocrítica há uma voz que já está lá, e ela é sábia e compassiva. Basta ouvi-la.

Texto: Marcela Braz.