O resgate do humano em um mundo que tem pressa e tela demais
Sabemos como o excesso de pressa e exposição a telas não é natural e nem faz bem ao ser humano, mas seguimos vivendo assim. É compreensível, porque um aspecto nosso biológico e fundamental é o fator social, a necessidade de aceitação do bando, para assegurar a sobrevivência.
Mesmo em 2023, milhares de anos após deixarmos de ser essencialmente caçadores e coletores, isso não é tão distante da nossa realidade. Precisamos trabalhar para nos sustentarmos, e parte importante dessa equação inclui responder e-mails, ter um perfil no LinkedIn, responder mensagens de WhatsApp e, para muitos, ficar em frente à tela do celular e do computador durante o expediente.
Além disso, já viraram lembranças distantes as pesquisas baseadas apenas na biblioteca da escola, transcrevendo frases e ideias à mão no caderno. Hoje em dia, temos ensino à distância ao nosso dispor, e os estudantes privilegiados também usam as telas para estudar.
Quanto à vida social, aprendemos a manter contato com as pessoas pelas redes sociais, fazendo vídeo chamadas, ouvindo áudios enquanto passamos aspirador na casa. Fora isso, o ritmo da vida atual parece ser ditado pelo medo. Se eu não entrar na esteira do tempo do outro, seja no trabalho, seja na vida pessoal, posso ser descartado.
Então nosso dilema permanece: como usar a tecnologia de forma equilibrada e encontrarmos um ritmo possível e saudável, algo entre o chamado burnout e não sair da cama? Como tudo na vida, não há fórmula mágica, nem receita que sirva para todo mundo.
Por isso mesmo, um bom caminho para começar é identificar qual é o seu ritmo pessoal, seu limite individual quanto à exposição a telas. Lembrando como ritmos e limites não são estáticos, são dinâmicos como nós, vivos como a natureza. Se considerarmos crianças e adolescentes, há parâmetros estabelecidos por órgãos como, por exemplo, a Sociedade Brasileira de Pediatria e outros que recomendam qual o limite de uso de telas nestas etapas do desenvolvimento.
Um caminho para se ter essa compreensão é aumentar a consciência emocional e corporal. Sentir no corpo quando ele pede pausa, água, comida, descanso. E respeitar isso. O coração está acelerado, e a ansiedade galopante? Essa é uma comunicação importante sobre nossos limites e necessidades.
Pode dar um certo medo de olhar para esses sinais. Um receio de abandonarmos todas as tarefas, nos tornarmos ineficientes profissionalmente, ou até de sermos excluídos socialmente por colocarmos alguns limites.
De acordo com uma pesquisa da International Stress Management Association (Isma), o Brasil é o segundo país no mundo com mais casos de burnout, distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico. E 20% dos brasileiros não ficam mais de 30 minutos longe do celular, de acordo com levantamento da Digital Turbine, em 2021.
Nesse contexto, para aumentar a consciência corporal e emocional, é preciso inserir espaços de descanso e conexão na rotina, para que virem hábitos. Algumas ideias práticas são meditar de manhã e à noite, fazer uma pausa para respirar antes de começar uma nova tarefa ou uma aula, incentivar os jovens a se conectarem com suas emoções e sensações corporais desde cedo, por meio da aplicação prática desses exercícios em aula, entre outras.
Para reduzir efetivamente o tempo de telas, com celulares e outros dispositivos, é preciso ter uma postura ainda mais firme e organizada. Colocar limites de tempo para o uso, criar o costume de deixar o celular longe de si – quando se está em casa, por exemplo – e tornar as vivências analógicas mais ricas e abundantes pode ajudar a transformar maus hábitos. Inserir mais leituras em papel, idas a peças de teatro, fazer programas artísticos ou na natureza, bem como investir em brincadeiras sem tela são algumas saídas.
Acima de tudo, o importante é não desistir. Podemos unir o entendimento de como é desafiador nadar contra a corrente à força de lutar pela vida que queremos ter. Testar ideias, adaptá-las à sua rotina pessoal, pensar em planos de contingência para situações inevitáveis e conversar com a família ou com quem divide a moradia são poderosos aliados ao comprometimento, que atualmente tem mais forças contra do que a seu favor.
Texto: Marcela Braz.